Da Redação
11 de fevereiro de 2014Definitivamente o ser humano não está preparado para perdas em qualquer dimensão e circunstância. Toda perda, a priori, gera um estranho desconforto, um abalo nas estruturas emocionais, um desequilíbrio interior… E não há consolo! Tudo isto a despeito de perdermos todos os dias. Quem já não perdeu o ônibus, a linha, o trem, a piada, o ano, a hora, o tempo, a oportunidade de calar. Mas quem diz que nos acostumamos a perder?
Perde-se: a compostura, a inscrição, a dimensão do fato, o lugar, o conceito, a dignidade, o senso do dever, a virgindade, o encanto, os dentes, a chave, a chance, o prazo, a prova, a paciência, o prestígio, o trem das onze, a hora e a vez, o tempo da colheita, a amizade, o fio da meada, o bonde da história… Perde-se, perde-se, perde-se… Perde-se! E fica a inútil sensação de que algo poderia ter sido feito para se evitar a catástrofe, a tragédia, a história de um fracasso.
Neste ensaio não quero me referir a perdas materiais, por marcantes e expressivas que sejam. Dentes, em se os perdendo, colocam-se outros, mais bonitos e duradouros até; carro, compra-se outro, melhor e mais novo; chances, outras haverá, muitas outras sem dúvida! Mas estas são perdas reversíveis.
Refiro-me a perdas de vidas, a ausências insondáveis e devastadoras. No ano que passou tive perdas emblemáticas, doloridas, irreparáveis… Perdi amigos, vi pais perderem filhos e filhos perderem pais. Algo alucinante! Se não estamos acostumados a perder bens materiais, imaginem perder vidas… Há uma relutância total para a aceitação. Nada nos conforta! Não há conformismo que não abale nossa estrutura. Quantas perdas irreparáveis, quantas famílias destroçadas… Ficamos céticos ante a implacabilidade do destino. Porque não tem volta. É cruel!
Neste momento o mundo despenca, caem por terra sonhos, planos, ambições, horizontes, limites… Já de nada valem as estruturas, até então sólidas, os conceitos filosóficos arraigados, a posição social, a estabilidade. Em determinado momento desce uma cortina e a partir daí todos os fatos têm contornos de fatalidade, a dor da ausência abre uma ferida, e nos questionamos sobre o sentido primeiro e último da vida.
Desmoronam os alicerces mais sólidos, as estruturas psicológicas, os tratados… A perda não tem consolo, pelo menos em curto prazo. Sempre haverá alguém, é verdade, que, não havendo outro gesto mais pertinente profere com ar professoral: “Nada como o tempo!”. Será? Cada um tem uma reação, e um modo personalíssimo de lidar com este processo de angústia, que outra coisa não é a perda, senão pura angústia! O tempo ameniza, mas não cura…
Há quem diga que os japoneses não choram diante de morte… É até possível, pois estamos falando de uma civilização milenar que, muito mais do que nós, ocidentais, personifica a consciência cósmica. Eles procuram se aperfeiçoar ao máximo aqui e agora e acreditam que outras vidas haverá, segundo a lei do eterno retorno. Preocupamo-nos em demasia com prêmios, prestígio, interesses, fama, ilusão…
Somos fracos, sensíveis e a razão não explica o essencial…
A experiência mais tocante que já vi em toda minha vida, já nem tão curta assim, aconteceu no ano que terminou. Em altas horas, chamaram-me. Perdi um amigo, um irmão de viola, de cavalgada, de cerveja, de sonhos… Ao lado do caixão, lívida, batendo os dentes, triste e inconformada, a esposa. Pediu-me que exaltasse as qualidades do marido. Eu o fiz, transido de dor, em breves palavras…
Ela estava tensa, inconsolável. A perda foi além de suas forças. No dia seguinte um telefonema acorda-me, desta feita, para dizer que a apaixonada esposa, não suportando a separação morrera de desgosto, de saudade, de dor… A partida foi dolorosa demais.
Ela não suportou o estigma da ausência, não resistiu ao apelo da fatalidade. E lá se foi para junto de seu amado. O badalar plangente dos sinos marcou o final de mais uma viagem. Alguém partiu! A bem da verdade, não estamos preparados para aceitar esta verdade irreversível e fatal: Nunca mais!
Luno Volpato é poeta, escritor, membro da Academia Campinense de Letras, presidente do Centro de Poesia e Arte de Campinas(CEPAC) e professor universitário
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