Da Redação
3 de janeiro de 2014Às vezes, tenho a impressão de que festa com data marcada começa e não vira nada. Quem sabe vem daí a razão do provérbio popular, segundo o qual o melhor da festa é esperar por ela. De fato, a véspera deixa a imaginação fora de si. Depois, surge a dura realidade e que fica sempre aquém do estratosférico horizonte criado pela imaginação alada. Para o mundo imaterial dos sonhos, vale a máxima do mundo mais aqui embaixo da gulodice: os olhos são maiores que a barriga. Principalmente na ceia de ano novo, seguida, fastidiosamente, do almoço em prol da mesma causa.
Mais um ano se passou. Pensamos e não fizemos. Fizemos sem pensar. Pensamos demais e fizemos de menos. Ou, ainda, nem pensamos e nem fizemos. Enfim, cada um que se curve e reflita sobre a vida que levou no ano passado. E uma boa forma de começar nosso exame pode ser, simplesmente, agradecer. Sim, um espírito de gratidão é capaz de dar outro sentido à nossa vida.
A gratidão, esse sentimento puro e desinteressado, faz com que o homem converta-se a si mesmo em devedor daquele de quem se recebe um dom. É uma intensificação da justiça, porque busca afirmar ao outro pagando-lhe amorosamente o devido a ele. Haver recebido põe o homem frente à justa obrigação de devolver ao menos uma parte do dom recebido. Muitas vezes este dever se vive, mais radicalmente, como ato prazeroso e espontâneo de agradecimento.
Nota-se, assim, que a gratidão tem uma dimensão social, ética e estética. Nas mais variadas formas, ponto que deixo ao exclusivo gosto do leitor. Há agradecimentos polidos (“Fico-lhe obrigado por tanta gentileza”) e não polidos (“Valeu!”). Agradecimentos masculinos (“Obrigado!”), femininos (“Obrigada!”) e politicamente corretos (“Obrigadx!”). Agradecimentos elegantes (“Estou ternamente agradecido!”) e comuns (“Agradeço a você!”). Agradecimentos antigos (“É alta a mercê que me fazes!”), modernos (“Obrigado!”), pós-modernos (“Obrigado eu!” e, na forma descortês, “Obrigado você!”) e virtuais (“#obrigadooogalera!”). Agradecimentos curtos (“Grato!”) e longos (“Muitíssimo obrigado!”).
Por falar em forma, para além de um certo formalismo vazio (bem ao gosto kantiano) que o cotidiano tende a arremessá-las, todas essas expressões, à primeira vista, tão inofensivas, incidem, originariamente, sobre aquelas importantes dimensões de nossa existência e, muitas vezes, mostram-se autênticas mensagens cifradas, por vezes infinitamente sutis, surpreendentes e sábias, como sempre nos ensinaram a prosa, a poesia, a filosofia, mas, sobretudo, a linguagem (etimologia e semântica).
Sob esse ângulo, o dinamismo da linguagem pode minar o sentido mais profundo do “obrigado” que, como outras expressões do cotidiano, é depositário da destilação das grandes experiências esquecidas. E se quisermos resgatar aquele sentido que elas encerram, devemos voltar-nos, criticamente, para esse depósito. Sob certa forma, é uma espécie de eterno retorno…nem que seja ao dicionário, responsável por detectar e registrar tais sentidos.
Louvo a atenção do leitor neste último ano: deixo aqui meus agradecimentos polidos, não polidos, masculinos, femininos, politicamente corretos, elegantes, comuns, antigos, modernos, pós-modernos, virtuais, curtos e longos. Este agradecimento, como epílogo de 2013, serve, também, como prólogo de 2014. Acabo por aqui, porque estou percebendo que o agradecimento está ficando maior que o espaço costumeiramente destinado à coluna e, de maneira pouco grata, pretendendo conquistar a autonomia de uma página inteira deste jornal. Com respeito à divergência, é o que penso.
André Gonçalves Fernandes é juiz de direito, mestre, pesquisador, professor do IICS-CEU Escola de Direito e coordenador do IFE CAMPINAS (agfernandes@tjsp.jus.br).
16 de junho de 2022
25 de junho de 2022
3 de junho de 2022
24 de junho de 2022
26 de junho de 2022
24 de junho de 2022
21 de junho de 2022
10 de junho de 2022
24 de junho de 2022
3 de junho de 2022
Flagrou algo inusitado e quer ver a sua notícia publicada? Nos envie seus textos, fotos e vídeos.
Os textos e comentários aqui expressos são de total responsabilidade de seus autores.